terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Monografia "A Poética Romântica de Renato Russo" - Renato Russo: o poeta da emoção subjetiva

5.2. Renato Russo: o poeta da emoção subjetiva
As letras de Renato Russo seguiram uma coerência poético-romântica.
Podemos ver algumas características românticas (COUTINHO, 1969: 6-7) e compará-las com a temática abordada por Renato Russo nas letras da Legião Urbana:

· Subjetividade e individualismo
Renato Russo escreveu letras confessionais, falou sobre as tristezas que machucavam o seu coração, sobre suas dores emocionais, sobre amor, sentimentalismo.
Sobre o seu individualismo, Renato Russo disse: “Sou anarquista e individualista, tenho uma visão poética, mas não me considero poeta. Procuro o belo” (PASSOS, 1995: 24).
“Será”, do primeiro álbum, traz versos que explicitam bem a visão romântica de Renato Russo, de um país que emergia dos escombros do regime militar e vislumbrava uma lenta abertura democrática, com o início da campanha “Diretas-Já”. Individualismo, solidão e a não pertença a nenhuma forma de dominação são traços românticos presentes na letra:

Tire suas mãos de mim
Eu não pertenço a você
Não é me dominando assim
Que você vai me entender
Eu posso estar sozinho
Mas eu sei muito bem aonde estou
Você pode até duvidar
É só que isso não é amor.

Numa de suas letras mais subjetivas, “Soul Parsifal”, do oitavo álbum, Renato mostrava bem a sua individualidade, ao mesmo tempo em que fazia um balanço de sua vida:

Ninguém vai me dizer o que sentir
Meu coração está desperto
É sereno o nosso amor
E santo este lugar.

Dos tempos de tristeza
Tive o tanto que era bom
Eu tive o teu veneno
E o sopro leve do luar.

Porque foi calma a tempestade
E tua lembrança, a estrela a me guiar
Da alfazema fiz um bordado
Vem, meu amor, é hora de acordar.

Tenho anis, tenho hortelã
Tenho um cesto de flores
Eu tenho um jardim e uma canção.

Vivo feliz, tenho amor
Eu tenho um desejo e um coração
Tenho coragem e sei quem eu sou
Eu tenho um segredo e uma oração.

Vê que a minha força é quase santa
Como foi santo o meu penar
Pecado é provocar desejo e depois renunciar.

Estive cansado
Meu orgulho me deixou cansado
Meu egoísmo me deixou cansado
Minha vaidade me deixou cansado.

Não falo pelos outros
Só falo por mim
Ninguém vai me dizer o que sentir.

Tenho jasmim, tenho hortelã
Eu tenho um anjo, eu tenho uma irmã
Com a saudade teci uma prece
E preparei erva-cidreira no café da manhã.

Ninguém vai me dizer o que sentir
E eu vou cantar uma canção pra mim.
Em “Uma Outra Estação”, do nono álbum, Renato afirma sua subjetividade:
Não me digam como devo ser
Gosto do jeito que sou.

Em “Sete Cidades”, do quarto álbum, Renato expressou seus sentimentos em relação ao amor:

Meu coração é tão tosco e tão pobre
Não sabe ainda os caminhos do mundo.
Quando não estás aqui
Sinto falta de mim mesmo
E sinto falta do teu corpo junto ao meu.

· Ilogismo
Não havendo lógica na atitude romântica, vemos a oscilação entre pólos opostos de alegria e melancolia, entusiasmo e tristeza (COUTINHO, 1969: 6).Renato Russo encaixa-se bem nessa característica, uma vez que ele mesmo se considerava psicótico-maníaco depressivo, como já comentado antes, alternando fases de alegria (ou pelo menos de serenidade pragmática) e depressão profunda.“Quase sem Querer”, do segundo álbum, mostra bem isso:

Tenho andado distraído,
Impaciente e indeciso
E ainda estou confuso
Só que agora é diferente:
Estou tão tranqüilo e tão contente.

Em “Uma Outra Estação”, do nono álbum, a instabilidade do espírito do eu lírico novamente nos coloca diante de signos e imagens:

Sei que não tenho a força que tens
Se me vejo feliz quase sempre exijo um talvez.
Ela mora perto de um vulcão
E meu coração suburbano espera riquezas maiores.
Eu sigo o calendário maia
Sou descendente dos astecas

· Senso de Mistério
O espírito romântico, segundo Coutinho (1969: 6), é atraído pelo mistério da existência e, na sua individualidade, encara o mundo com espanto, pois tudo lhe parece sempre novo: a melancolia, a própria vida, que ele procura viver independente de tradições.Renato Russo, em suas letras intimistas, sempre demonstrou fascínio pelo mistério da vida, do universo, da existência. Em “Quase sem Querer” mostra-se fascinado pelas coisas que não têm explicação, entre a complexidade e o cotidiano:

Tão correto e tão bonito
O universo é realmente
Um dos deuses mais lindos.
Sei que às vezes uso palavras repetidas
Mas quais são as palavras
Que nunca são ditas?
· Escapismo
Renato Russo, diante de uma sociedade caótica, sonhava com um mundo idealizado e perfeito, onde o amor e o respeito prevalecessem. Em “Vamos Fazer um Filme”, Renato nos apresenta imagens carregadas de muita emoção para mostrar como deveria ser o mundo.
A letra começa mostrando o amor como o grande salvador. O eu lírico, saudoso, busca na imagem (fotografia) a volta ao passado. Tal temática é constante no Romantismo, como nos poemas de Casimiro de Abreu:

Achei um 3x4 teu e não quis acreditar
Que tinha sido há tanto tempo atrás
Um exemplo de bondade e respeito
Do que o verdadeiro amor é capaz.

O poeta sente a necessidade de criar um mundo maravilhoso, que foge da lógica e do racional. Vale lembrar que o Romantismo trabalha também com o ilogismo. Assim, as imagens desse escapismo são cinematográficas:

Sem essa de que: "Estou sozinho."
Somos muito mais que isso
Somos pingüim, somos golfinho
Homem, sereia e beija-flor
Leão, leoa e leão-marinho.

Logo em seguida, mostra toda a sua carência e a necessidade de ter a sua individualidade respeitada:

Eu preciso e quero ter carinho, liberdade e respeito
Chega de opressão
Quero viver a minha vida em paz.
Quero um milhão de amigos
Quero irmãos e irmãs
Deve de ser cisma minha
Mas a única maneira ainda
De imaginar a minha vida
É vê-la como um musical dos anos trinta
E no meio de uma depressão
Te ver e ter beleza e fantasia.

Renato questiona sobre a vivência do amor numa sociedade sem compaixão e que se esqueceu de valorizar os sentimentos mais puros e sem interesses mesquinhos. O final lembra o clássico happy end dos filmes de amor:

E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
Eu te amo
Eu te amo
Eu te amo

Sobre essa letra, comentaram Castilho & Schlude (2002: 81):

Os escapismos dão-se em várias letras como em “Vamos fazer um Filme”. A necessidade de se libertar dessa vida como um todo é uma necessidade constante, está de acordo com o mal-estar do eu romântico que anseia escapar desse mundo.

Um comentário:

  1. Renato Russo é o nosso mestre!
    Sigo sempre, ou pelo menos tento seguir o lema: "Ninguém vai me dizer o que sentir.", neste exato momento estou precisando colocar tal frase em prática, pois estou para tomar uma decisão e fico preocupado com o que as pessoas que me cercam vão dizer. Tenho que parar com isso e colocar o lema do mestre Renato em prática.

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